Cancioneiro de Mora


O canto faz parte da cultura do Alentejo.

Hoje proponho uma passeata pelo cancioneiro de Mora. Venham daí comigo numa incursão pelo livro Mora e o seu concelho (1) que tão gentilmente me foi oferecido o ano passado por Joana Ferreira (2).

Não me demoro mais com a minha prosa. Vou directa às palavras de Lopes Correia que nos fala assim:

"Dá-se, a seguir, o pequeno cancioneiro que conseguimos recolher. Lamentamos não poder dar os cancioneiros das restantes freguesias, mas foi impossível obtê-los. Paciência.  

Quanto ao que apresentamos, apenas duas palavras para dizer que em Mora se canta pouco.  O morense não é alegre e dado as festas. Pode gostar disto ou daquilo, mas não se manifesta; ou, se se manifesta, é discretamente. (...) Na vila é raro ouvir-se cantar. Somente em duas ocasiões o morense cantava. 

Uma, quando tirava as sortes (3). Nesse dia, sim, os rapazes faziam a sua festa com muita alegria. Já dois ou três dias antes, pela tardinha, percorriam eles a vila aos grupos, em cantoria e aos vivas. Depois, no dia em que eram inspeccionados, o seu entusiasmo atingia o auge. Acompanhados por um tocador de concertina desde manhã cedo até noite alta percorriam as ruas a cantar, agitando pandeiretas enfeitadas de fitas e eles próprios  também com as suas fitas nas lapelas ou a tiracolo, vermelhas se ficavam apurados, brancas se ficavam livres e verdes se de espera. Esse dia era por eles considerado o dia da sua maioridade.

Na balada dos ranchos para a região de Elvas, aí pela Primavera, também as raparigas cantavam em coro, numa alegria desbordante, enquanto a camioneta que as levaria não largava. Na volta, à entrada de Agosto, acontecia o mesmo. Fora disso só no campo durante as mondas e as ceifas. E muitas vezes pela madrugada, quando partiam para o trabalho, em ranchos."


Lopes Correia recolheu 223 quadras. Aqui publico algumas delas. (4)

1                                                                           2                                                                   3

A açucena ao pé da água,                      Adeus aldeia das Brotas                 Adeus ò vila de Mora
Pode estar quarenta dias                      Cá me alembraste agora.               Adeus, vila de Pavia;
Eu sem ti nem uma hora,                       Não é de ti a lembrança,                 Eu vou assentar praça
Quanto mais noites e dias                    É da gente que lá mora.                  No Onze de Infantaria

 4                                                                          5                                                                  6    

Castanheiro dá castanhas,                    Ao passar o ribeirinho                 Não julguem que por cantar
Castanheiro dá só uma                           Pus o pé na violeta;                        Que a vida já bem me corre
Para dar ao meu amor                             Quem não sabe namorar             Eu sou como o passarinho
Qu'inda não comeu nenhuma.            Em tal coisa não se meta.           Tanto canta até que morre.

(1) Mora e o seu concelho, Lopes Correia, Câmara Municipal de Mora, 1998, 3ª edição
(2) https://www.facebook.com/avo.janeca
(3) Os rapazes tinham que “ir às sortes” logo que completassem os 18 anos de idade. “Ir às sortes” como se dizia na época, era ser chamado para a inspeção militar. Boa sorte se ficasse livre, má sorte se fosse apurado.
(4) As restantes podem ser consultadas no livro, disponível na Biblioteca da Plataforma Cultural  
      Ossamorena:        https://ossamorena.pt/biblioteca/
Foto: 1) http://www.arpimora.org/?page_id=321 
             2 e 3) Google

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