Entrevista a José Peixoto - Criador do Festival Música do Rio, outros sons do Fluviário

José Peixoto

Foto de António Jorge Gonçalves

José Peixoto, guitarrista e compositor português, é mais um dos artistas apaixonados pelo Alentejo e pela Malarranha. Dele nasceu a ideia de criar o festival Música No Rio, os outros sons do Fluviário

O músico concedeu uma entrevista ao Mora Mundus para nos falar deste evento que terá a sua décima segunda edição este mês de Julho de 2022 e que é já uma valor consolidado e de imensa qualidade no panorama cultural do Concelho de Mora.   

Julho 2017

 1. Como  e quando surgiu a ideia de criar o Festival Música no Rio, os outros sons do Fluviário? Qual a fonte de inspiração? 

A grande fonte de inspiração foi o local da praia fluvial no Parque Ecológico do Gameiro. Um dia, em 2009, estava lá de passeio e pensei em como seria bom haver ali um pequeno ciclo de concertos em formato "auditório" para se poder estar tranquilamente sentado a ouvir boa música naquele cenário paradisíaco com o espelho de água por trás.
 
Falei nisso casualmente a um amigo meu que reside perto da Malarranha (o José Onofre) e ele promoveu um encontro com o Presidente da Câmara, o Eng. Luis Simão. Nessa reunião ficou a vontade de aprovar o projecto que apresentei: um concerto de música clássica (com orquestra), outro no universo do jazz e/ou música instrumental, outro de fado e, por último, um de "música popular portuguesa de qualidade". 
 
O primeiro cartaz foi decisivo para a direcção futura. Tivemos a Sinfonietta de Lisboa com o pianista Bernardo Sassetti, a Maria João com o Mário Laginha, a Mafalda Arnaut e, por último, o Sérgio Godinho. Ficava assim definida a intenção de "serviço público cultural" do Festival, uma aposta na qualidade da música apresentada e a intenção de gerar uma oferta diferenciada no panorama de festivais de Verão mais virados para um consumo de entretenimento à volta dos nomes que sazonalmente vão estando em alta. 
 
Confesso que tive sorte com o acolhimento que tive da parte do Presidente e da sua equipa, que num espírito de cooperação, boa comunicação e compreensão da figura e do papel do Director Artístico, permitiram uma programação independente e sem qualquer tipo de ingerência ou decisões à revelia. Estou bastante agradecido pelo respeito demonstrado. E só assim se conseguiu um bom equilíbrio.
 

 2. Como  se  cruza o  seu percurso de  guitarrista e compositor com a programação  que tem sido escolhida      para o festival ao longo dos anos?

A minha principal preocupação era a de estabelecer um bom equilíbrio entre uma oferta de música que não seria a mais conhecida, a qualidade da apresentação da mesma e a junção no mesmo ciclo de alguns nomes mais familiares mas sem a pressão do mercado e das modas. Claro que o meu percurso enquanto músico coloca-me mais próximo de alguns critérios (ainda que subjectivos, como é evidente) que me permitem pensar num todo que se harmonize e sem nunca perder de vista o padrão da qualidade. No fundo é como se pudéssemos transportar a música que se pode ouvir em auditórios de média dimensão de grandes centros urbanos e com uma cuidada programação para um local privilegiado imerso na natureza. E poder tirar partido desse factor positivo. Nunca foi o objectivo inicial eventos para grandes massas. E penso que foi conseguido um resultado interessante até agora. Houve concertos únicos, extraordinários, de vários quadrantes musicais e com grande diferenciação estética. E inclusivamente duas estreias mundias, o concerto para Guitarra e Orquestra do Pedro Jóia (2012) e o concerto para Quarteto de Guitarras e Orquestra de André Santos - Quarteto de Guitarras de Lisboa (2015). Passaram por Mora intérpretes e compositores de imensa qualidade que não colhem a disponibilidade dos canais de divulgação. Foi bom terem passado por aqui. E um dos critérios era o de fazer sentido aquelas músicas naquele local.

3. Sei  que  vive  no  concelho de  Mora  há  alguns anos.  Que  influência  têm tido  na  sua música  as  suas     vivências no Alentejo? 

A minha residência permanente não é no concelho de Mora. Mas passo aí grandes temporadas e todos os fins-de-semana que posso. O Alentejo sempre foi para mim uma espécie de local mágico. A sensação de espaço, o horizonte aberto, a estética da arquitectura popular, um reduzir do ritmo e o alargamento do tempo, enfim, toda uma série de sensações e vivências que, inevitavelmente, desembocam em qualquer processo criativo em que estejamos envolvidos. E não significa tocar ou fazer música mais lenta. Permite sim é ganhar o espaço interno e a tranquilidade necessária para se fazer música seja ela em que direcção for...

 

Apontamentos biográficos

José Peixoto

Guitarra clássica

Nascido em 1960, José Peixoto conclui em 1981 o Curso Geral de Guitarra Clássica da Academia de Amadores de Música de Lisboa, prosseguindo depois os seus estudos com o professor Piñeiro Nagy.

Associando formação clássica com uma enorme experiência como músico, arranjador, produtor e compositor em diversos géneros musicais, o guitarrista José Peixoto concluiu em 1981 o Curso Geral de Guitarra da Academia de Amadores de Música de Lisboa.

Foi professor nessa mesma escola entre 1982 e 1992, tendo prosseguido também os seus estudos com o professor Piñeiro Nagy.

Em 1980 concluiu o 1º ano de Arquitectura na ESBAL (Escola Superior de Belas Artes de Lisboa), tendo desistido posteriormente do curso para se dedicar exclusivamente à música.

Fez parte, como alaudista, do grupo de música antiga La Batalla, com o qual gravou “Cantigas de Amigo”.

Em 1989 formou, com José Mesquita Lopes e António Ferreirinho, o Trio de Guitarras de Lisboa, com o qual participou em diverso festivais e gravou para a rádio e a televisão.

Como músico e compositor, integrou o trio de música instrumental Shish, com o qual gravou Espaços, em 1987, e o agrupamento formado por Mário Laginha, Mário Barreiros, Carlos Bica, José Martins e Martin Fredebeul, com que gravou em 1988 “El Fad”.

Com o contrabaixista de jazz Carlos Bica criou, em 1989, o grupo Cal Viva, que dá nome ao cd gravado, apresentado em concerto na Europa e em Macau, ao qual, a partir de 1991, se associaram Maria João e Mário Laginha para uma série de tournées europeias, que incluíram a gravação de “Sol” para a editora alemã Enja.

Trabalhou também em diferentes projectos com, entre outros, os músicos Janita Salomé, Pedro Caldeira Cabral, José Mário Branco, Maria João, Rui Veloso, Júlio Pereira, etc.

Gravou em 1994 o cd “Taifa” com o guitarrista Mário Delgado e o percussionista José Salgueiro.

Nas composições para bailado destacam-se “Alto Contraste”, em parceria com Nuno Rebelo, apresentado pelo Dança Grupo em 1990 na Fundação Calouste Gulbenkian, “Núcleo”, estreado em 1991 no Acarte pelo grupo da coreógrafa  Margarida Serrão, e a banda sonora do bailado “Vozes Caladas”, da coreógrafa Amélia Bentes, apresentado pela Companhia de Dança de Almada.

A partir de 1993 e durante mais de uma década fez parte do grupo Madredeus com o qual efectuou várias tournées mundiais e gravou sete cd’s.

O seu trabalho a solo está registado em “As Vozes dos Passos”, de 1996 e “A Vida de Um Dia”, de 1998. Em 2000 gravou “O que me diz o espelho de água”, com a colaboração do contrabaixista Mário Franco.

Ainda no ano 2000 é editado pela Musicoteca o álbum de partituras “Amarelos e outros tons” com oito peças para guitarra, uma das quais, a que dá nome ao álbum, é peça obrigatória no exame de admissão para o Curso de Guitarra da Escola Superior de Música de Lisboa.

Em 2001 é editado o CD “A Tempo”, uma antologia em que é incluída a música do bailado “Núcleo”, composta em 1991.

No ano de 2002 grava com o músico Fernando Júdice o CD “Carinhoso” baseado na obra do compositor brasileiro Pixinguinha, considerado o pai do chorinho brasileiro.

Grava em nome próprio uma série de cd’s, entre os quais “Aceno” (2003), para o qual convida o guitarrista americano Ralph Towner, “Estrela” (2004) com Filipa Pais, “Cacus” (2005), em duo com o violinista Carlos Zíngaro e “Pele” (2006) com Maria João.

Em 2005 é-lhe atribuído pela Rádio Central FM o troféu “O Melhor Guitarrista do Ano”.

Reactiva em finais de 2007 o grupo de jazz português contemporâneo El Fad com o qual grava dois cd’s: “Vivo” em 2008 e “Lunar” em 2010. São incluídos na lista de melhores edições dos respectivos anos pela revista Jazz.pt.

Faz a produção e direcção musical do disco “Todas las horas son viejas” da cantora espanhola Maria Berasarte (2009) e da peça “A Lua de Maria Sem” (2011), sobre fados de Alfredo Marceneiro,  com texto e letras de João Monge e que estreou no Teatro S. Luis em Lisboa.

Juntamente com o percussionista José Salgueiro grava o projecto Aduf (grupo que inclui cinco percussionistas) em 2010 e com edição de um dvd em 2011

Em 2011 ganha o prémio Carlos Paredes com o CD “Lunar”.

Escreve a música para a peça de teatro “Guerras de alecrim e manjerona” (ópera lírico-jocosa de António José da Silva, séc XVIII) para o Teatro da Terra (da actriz Maria João Luis) com estreia em Novembro de 2011.

Em 2012 edita com o apoio da Sociedade Portuguesa de Autores três livros de partituras: “Sete Canções e quatro prelúdios”, peças para duas guitarras clássicas e voz sobre sete poemas de Eugénio de Andrade, “Sete Canções Imaginárias” para trio de guitarra, flauta e violoncelo e “Peças para guitarra” (oito solos, um dueto “SCAN” e um quarteto de guitarras “IN-INPUT”).

Edita em Junho de 2012 o CD “Volta”, em duo com o contrabaixista António Quintino e tendo como convidado o percussionista José Salgueiro.

Em 2013 escreve música original para a peça “Ninguém se ouve, ninguém se vê” (a partir de A Gaivota de A. Tchékhov) com encenação de Maria João Luis (Teatro da Terra).

Em 2014 cria o LST - Lisboa String Trio, juntamente com Bernardo Couto (guit portuguesa) e Carlos Barretto (contrabixo) com quem edita o CD “Matéria”.

Este CD é galardoado com o prémio Carlos Paredes em 2015.

Ainda em 2014 escreve música original para a peça “Na solidão dos campos de algodão” de Bernard-Marie Koltés com encenação de Maria João Luis, Rita Blanco e Marcello Urgeghe.

Em 2015 escreve música original para a peça “Um conto de Natal” de Charles Dickens, com encenação de Maria João Luís e Ricardo Neves-Neves.

Em 2016 edita o CD “Lisboa”, o segundo registo do LST – Lisboa String Trio. Este CD é um dos nomeados para a categoria de Melhor Disco de 2016, prémio instituído pela Sociedade Portuguesa de Autores.

Em 2017 escreve música original para a peça “Finisterra” , encenada por Maria João Luís e Mickael de Oliveira.

Ainda em 2017 grava juntamente com a cantora Sofia Vitória o CD “Belo Manto”, com música original para poesia Luso- Árabe e poesia medieval Portuguesa.

Em 2018 escreve música original para as peças “Quando vai Carmen fazer Lady Macbeth?” dirigida por Nuno Pino Custódio e interpretada por Elsa Valentim (Teatro dos Aloés) e “Pela água” de Tiago Correia (Grande prémio do Teatro Português 2016), com encenação de Tiago Torres da Silva (Teatro Aberto)

Em 2019 escreve a partitura para a peça de tetro “Ermelinda do rio”, interpretada e encenada por Maria João Luís (Teatro da Terra) com texto de João Monge. Música tocada ao vivo por um trio de contrabaixos.

Em 2019 escreve e interpreta ao vivo com um ensemble constituído por guitarra, sítar, cello, contrabaixo e percussão, música para a peça “Sonho de uma noite de Verão” de W. Shakespeare encenada por Maria João Luís (Teatro da Terra).

Em 2020 edita “Aqui e Ali” com o grupo LST – Lisboa String Trio.

Em 2021 escreve a banda sonora para “A comédia de Rubena” de Gil Vicente, projecto de teatro radiofónico sob a direcção do encenador Miguel Sopas.

Fonte: wikipedia




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