A história de Joaquina Carloto

 

 
Duas épocas lado a lado. Cada qual com sua história.
Uma, milenar e sobejamente conhecida.
Outra, atrás do gradeamento desta janela e que ninguém se lembra.
Quando eu tinha 12/14 anos participei activamente nesta história.
Há 50 anos as raparigas que terminavam a 4a classe tinham poucas hipóteses de trabalho.
Agricultura, costura ou criadas.
A dona desta casa nasceu e cresceu num monte perto de Pavia e por isso desenvolveu sozinha toda a sua criatividade.
 
Já era mulher quando o pai construiu esta casa e se mudaram para a vila.
Foi aqui que ela deu a conhecer os seus dons.
E foi nesta altura que tive o privilégio de aprender com ela a arte de bordar.

Os seus trabalhos pareciam pintados e não bordados.
Com ela passava 8 horas diárias nesta sala e foi aqui que conheci uma das melhores pessoas que encontrei na vida. De sentimentos e de criatividade.
 
Além de bordar fazia muitas outras coisas.
No Verão e Outono íamos caminhar pelo campo em busca de "qualquer coisa" e regressávamos cansadas e encaloradas com um cesto cheio de pequenas pedras e troncos, plantas e flores secas, sementes...
 
Eu, gaiata, olhava para o cesto e só via elementos da natureza a maior parte deles já mortos.
Também nesta área me ensinou que tudo se pode transformar começando a fazer pequenas obras de arte nas quais eu participava.
 
Muitas vezes ia ao quintal e colhia flores que tinha semeado. Pegava nos pincéis e nos óleos e deixava-as eternizadas em pequenos pedaços de vidro ou madeira. Também trabalhou em barro, escama de peixe, conchas... Fez verdadeiras obras de arte em conchas e outros elementos marinhos. Representou muitos pontos da vila e da vida diária. O coreto com a banda de música, uma chaminé alentejana onde não faltava o pai a descansar, a mãe a fazer o jantar na tigela de fogo na trempe sobre o lume e o filho a ler a lição escolar. Um trabalho de uma minúcia incrível.
 
Joaquina Maria Policarpo Ribeiro
 
Muito havia ainda a dizer desta artista de grande valor que ficou no esquecimento.
Terá mais de 80 anos, encontra-se num lar e ainda cheia de imaginação para desenvolver trabalhos... Conhecida por Joaquina Carloto, alcunha de família. 
 
 

Comentários

  1. Felizmente, ainda há por aqui alguns que se lembram desta e de outras histórias de vida que merecem a nossa atenção.

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares